Tomado como piada ao anunciar sua
candidatura, houve quem comparasse Donald J. Trump aos candidatos brasileiros à
presidência da República mais excêntricos e de expressão mais irrelevante.
Ao vencer as primeiras eleições primárias, ele
certamente percebeu que ainda assim não havia convencido os mais céticos sobre
suas reais chances de vencer a concorrência pela nomeação à candidatura do
partido republicano. Ao assumir a liderança nas pesquisas e nas apurações dos
votos de cada um dos delegados do partido, uma mistura de incredulidade e
apreensão tomou conta de todos os que, outrora, duvidaram que sua campanha se
tratasse de algo real e planejado para vencer. Quando “Mister Trump” foi
apontado pelo partido Republicano, com certo constrangimento, candidato à
presidência da suprema potência econômico-militar do mundo, os progressistas,
os liberais e os libertários perceberam que ele se tratava de uma ameaça real a
suas ideologias.
O fato de um homem com propostas
tão polêmicas ter chegado a uma posição tão proeminente deixa claro que ele não
era o único a acreditar que em suas ideias extremistas jaz a solução para
eventuais problemas pelos quais os Estados Unidos estejam passando. Sua eleição
expõe ao mundo a mente de um grupo gigantesco de norte-americanos que pensa
exatamente como seu atual presidente, ainda que não tenham, por receio,
vergonha ou desinteresse, buscado manifestar suas posições ao longo da campanha
política.
Concordemos ou não com suas
ideias e propostas, é impossível não nos maravilharmos com o fato de que alguém
inicialmente tão desacreditado, sem histórico eletivo, sem experiência na
administração pública, sem padrinhos, sem o menor medo de desagradar e talvez o
mais chocante: sem o apoio formal de grandes figuras de seu próprio partido,
chegando, inclusive, a ter desaprovação expressa de certas figuras republicanas
tradicionais como Mitt Romney e John McCain, pode sobrepujar tudo isso e se
tornar presidente. Isso é algo inédito e que vai, decerto, marcar indelevelmente
a história da democracia mundial.
No entanto, vencer as eleições
não significaria, necessariamente, colocar em prática tudo o que foi prometido.
Para um povo tão acostumado com o chamado estelionato eleitoral como é o povo
brasileiro, exercido descaradamente há anos por diversos partidos e políticos, isso
não seria recebido com espanto e muito menos com perplexidade por nós. Ainda
que o presidente eleito tenha mantido o discurso duro durante a fase de
transição, muitos levantaram teses de que o presidente que havia sido eleito
seria bem diferente do presidente em exercício. A questão do muro que
terminaria de ser construído na fronteira com o México e que seria, de acordo
com Trump, pago pelos próprios mexicanos foi um dos pontos a ser apontado como
algo que não seria executado pelo novo presidente. As questões protecionistas
que viriam a intervir fortemente no mercado de ativos, bens e serviços foram
outros pontos cuja efetivação foi colocada em dúvida por analistas
internacionais.
Nos últimos dias, com apreensão,
o mundo tem sido convidado a assistir que as primeiras medidas do novo
morador-mor da Casa Branca vão ao encontro de tudo que foi prometido durante o
processo eleitoral que culminou em sua vitória. Desde o discurso de posse até a
determinação de impedir a entrada de cidadãos de determinados países, ainda que
possuam visto de residência permanente no país (apesar do posterior recuo
prático anunciado pelo Departamento de Estado), passando pela autorização para continuação
da construção do infame muro e chegando à quebra de acordo com a Austrália para
o recebimento de imigrantes: todas as medidas tomadas, decretos assinados,
entrevistas concedidas e encontros realizados deixam claro que o tom radical - e
mesmo xenófobo - da campanha se alongará por todo seu mandato.
Donald John Trump mostra que é um
homem de palavra. Ainda que, neste caso, isso não signifique, necessariamente,
uma qualidade louvável.